Por Natália Costa – Psicóloga e Diretora do CENSA Betim
Publicado originalmente em 02/06/2015 – Revisado e adaptado para web
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Falar sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) tem sido cada vez mais comum, principalmente quando o assunto é a importância do diagnóstico precoce e da intervenção na infância. Mas o que pouco se discute — e que precisa urgentemente de visibilidade — é o envelhecimento da pessoa com autismo.
O que acontece com essas crianças quando crescem? Como garantir qualidade de vida na fase adulta e, sobretudo, na velhice?
O desafio invisível do envelhecimento
O TEA é um transtorno do neurodesenvolvimento que se manifesta desde os primeiros anos de vida, comprometendo aspectos da comunicação, interação social e comportamento. Apesar dos avanços em informação e diagnóstico, ainda há carência de políticas públicas e estudos que abordem a trajetória de vida dessas pessoas após a fase adulta.
Estima-se que o autismo atinja cerca de 1% da população mundial — o que representa aproximadamente 70 milhões de pessoas. No Brasil, ainda não há dados oficiais sobre o número exato de adultos com TEA. No entanto, sabemos que o aumento da expectativa de vida da população também se aplica às pessoas com autismo, que estão envelhecendo e enfrentando novos desafios.
Autismo e comorbidades na vida adulta
Grande parte dos adultos com TEA apresenta também deficiência intelectual, epilepsia ou Síndrome de Down. Essas condições, combinadas com o processo natural de envelhecimento, exigem atenção redobrada. Muitas dessas pessoas têm dificuldade em realizar tarefas cotidianas sem apoio e, com o tempo, tornam-se ainda mais dependentes — sobretudo quando já não contam com a presença dos pais ou cuidadores originais.
Também é comum a presença de efeitos colaterais acumulados pelo uso contínuo de medicações, especialmente os neurolépticos. A ausência de suporte público, somada à falta de estrutura familiar em alguns casos, contribui para uma condição de vulnerabilidade social severa.
Uma resposta possível: cuidado continuado, ambiente adaptado
Com mais de 50 anos de atuação, o CENSA Betim é referência no Brasil no atendimento a adultos com deficiência intelectual. A instituição oferece não apenas acolhimento, mas uma proposta de vida estruturada: cada residente participa de atividades adaptadas às suas capacidades, como artesanato, equitação, natação, música, culinária, horta, entre outras.
Esse cuidado é coordenado por uma equipe transdisciplinar composta por médicos, psicólogos, fisioterapeutas, pedagogos, nutricionistas, cuidadores e educadores especializados.
Mais do que acolher, o CENSA cria um ambiente seguro, estimulante e digno para que esses adultos — muitos com histórias de abandono, negligência ou esgotamento familiar — possam envelhecer com proteção, saúde e pertencimento.
Participação social e políticas públicas
A qualidade de vida no envelhecimento da pessoa com autismo exige mais do que cuidados individuais. Exige também a atuação de políticas públicas, debates legislativos e participação ativa da sociedade. Em eventos como o Autismo na Vida Adulta e o 1º Congresso Internacional Autismo, realizados em parceria com universidades e associações especializadas, discutimos amplamente a importância de oferecer suporte não apenas ao autista, mas também às suas famílias.
Essa construção coletiva é fundamental para garantir que nenhuma pessoa com autismo seja invisibilizada no processo de envelhecimento.